terça-feira, agosto 4
O que há em mim é sobretudo cansaço —
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo, cansaço.
A sutileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto em alguém,
Essas coisas todas -
Essas e o que falta nelas eternamente;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço, cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada —
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser… E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto…
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço,
Íssimno, íssimo, íssimo,
Cansaço…
Alváro de Campos
Vamos, não chores!
A infância está perdida,
a juventude está perdida
mas a vida não se perdeu.
O primeiro amor, passou.
O segundo amor, passou.
O terceiro amor, passou.
Mas o coração continua.
Perdeste o melhor amigo,
não tentaste qualquer viagem.
Não tens casa, navio, terra.
Mas tens um cão.
Algumas palavras em voz mansa
te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam…
Mas e o humor?
Tudo somado, devias precipitar-te de vez nas águas…
Estás nu, na areia, no vento.
Dorme meu filho, dorme.
Carlos Drummond de Andrade
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