quarta-feira, julho 9
O coração morto
Fabio Bocchi
Hoje, noticiaram uma coisa deveras interessante: Morreu um coração! O seu dono permaneceu em pé, mas o coração simplesmente morreu. Intrigando legistas, cardiologistas e toda uma junta médica, um homem foi se examinar.
O coração parecia normal. Sem câncer, entupimento, mancha ou ventrículo trocado. Ele simplesmente parou. Foram feitos uma bateria enorme de exames, todos os dias, durantes meses, com todos fluídos possíveis e imagináveis do corpo humano. Depois de muito tentar a junta médica — de todos especialistas renomados do mundo- deixou o peito aberto, o coração exposto ao vento e perigos de infecção. Entretanto, não importava, já que havia morrido.
Depois de muito procurar ajuda — psicanálise homeopatia cirurgia cardiovascular desfibrilador macumba despacho Exu Ogum Diana Hércules Prozac e Lamivudina — o dono desse coração resolveu deixá-lo aberto à exposição, e tornou-se peça de um museu de horrores — pois era um corpo com fluxo normal e coração parado.
Pessoas vinham de todo canto do mundo, cada uma contendo a explicação e ninguém conseguia fazer aquele coração voltar. Vieram Pajens, Xamãs, o Papa, Inri Cristo, David Cooperfield, Blaine, magos com seus raios, trovões e poções! E nada disso acordava o empedrado coração.
Um dia, uma mulher quis tocá-lo. Uma pobre camponesa do Quênia, que havia vindo com seu Xamã pai, intercedeu pelo coração com um toque de indicador. O coração pareceu ter uma gota de cor diferente daquela cinzenta. Intrigado com a mudança, todos os que haviam passado pelo local, e o próprio dono que já adormecera há tempos, viraram sua atenção para a gota: ela parecia se expandir e começou a cobrir a superfície daquela pobre pedra, que um dia batera.
Aquela gota começou a expandir e buscar laterais, superfícies. Médicos do mundo inteiro correram para o local, intrigados com aquela melhora. Realizaram todos os procedimentos para a melhora do homem, e ficaram a segurar a pobre camponesa com suas mil perguntas, exames, máscaras anti-germes, lenços desinfetados e todas as armadilhas da ciência moderna.
Depois de estabilizado, saudável e caminhando, o homem que viveu no perjúrio da frieza encontrou com quem lhe devolveu a vida: ela estava numa sala para estudos, com tubos, sondas, agulhas, soníferos e todo tipo de relaxante. Ao vê-la, o homem começou a chorar, e não sabia o que fazer além de perguntar o que havia ocorrido.
Muito fraca, a pobre camponesa simplesmente respondeu: “Eu o amei! Por um segundo infinito, amei sua dureza.” E depois disso, dormiu. Um sono eterno, coberto com um manto branco.
Na lápide, a família da camponesa colocou: “A que ressuscitou um coração.”, e o homem — que já havia partido para os confins do mundo — escreveu embaixo “E sou grato por isso”.
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