quarta-feira, setembro 2


Dormi contigo a noite inteira junto ao mar, na ilha.
Selvagem e doce eras entre o prazer e o sono,
entre o fogo e a água.

Talvez bem tarde os nossos
sonos se uniram na altura e no fundo,
em cima como ramos que um mesmo vento move,
em baixo como raízes vermelhas que se tocam.

Talvez o teu sono se separou do meu e pelo mar escuro
me procurava como antes, quando nem existias,
quando sem te enxergar naveguei a teu lado
e teus olhos buscavam o que agora – pão,
vinho, amor e cólera – te dou, cheias as mãos,
porque tu és a taça que só esperava
os dons da minha vida.

Dormi junto contigo a noite inteira,
enquanto a escura terra gira com vivos e com mortos,
de repente desperto e no meio da sombra o meu braço
rodeava a tua cintura.

Nem a noite nem o sonho puderam nos separar.
Dormi contigo, amor, despertei, e a tua boca
saída do teu sono deu-me o sabor da terra,
de água-marinha, de algas, de tua íntima vida,
e recebi o teu beijo molhado pela aurora
como se me chegasse do mar que nos rodeia.


Pablo Neruda

Um comentário:

Passione disse...

lindo...!!!!..durmo contigo todas as noites....Chen

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