terça-feira, abril 29

DEVANEIOS DE FLORBELA ESPANCA


DESALENTO

Às vezes ouço rir, é ’ma agonia
Queima-me a alma como estranha brasa
Tenho ódio à luz e tenho raiva ao dia
Que me põe n’alma o fogo que m’abrasa!

Tenho sede d’amar a humanidade…
Eu ando embriagada… entontecida…
O roxo de maus lábios é saudade
Duns beijos que me deram n’outra vida!

Ei não gosto do Sol, eu tenho medo
Que me vejam nos olhos o segredo
Que só saber chorar, de ser assim…

Gosto da noite, imensa, triste, preta,
Como esta estranha e doida borboleta
Que eu sinto sempre a voltejar em mim!

Florbela Espanca - Trocando olhares

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"Quem me dera encontrar o verso puro,
O verso altivo e forte, estranho e duro,
Que dissesse a chorar isto que sinto!"

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Eu tenho pena da Lua!
Tanta pena, coitadinha,
Quando tão branca, na rua
A vejo chorar sozinha!…

As rosas nas alamedas,
E os lilases cor da neve
Confidenciam de leve
E lembram arfar de sedas

Só a triste, coitadinha…
Tão triste na minha rua
Lá anda a chorar sozinha …

Eu chego então à janela:
E fico a olhar para a lua…
E fico a chorar com ela! …

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Versos! Versos! Sei lá o que são versos…
Pedaços de sorriso, branca espuma,
Gargalhadas de luz. cantos dispersos,
Ou pétalas que caem uma a uma.

Versos!… Sei lá! Um verso é teu olhar,
Um verso é teu sorriso e os de Dante
Eram o seu amor a soluçar
Aos pés da sua estremecida amante!

Meus versos!… Sei eu lá também que são…
Sei lá! Sei lá!… Meu pobre coração
Partido em mil pedaços são talvez…

Versos! Versos! Sei lá o que são versos..
Meus soluços de dor que andam dispersos
Por este grande amor em que não crês!…

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...sou uma mulher como todas do planeta, que merece amar e ser amada.

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