segunda-feira, abril 28


Se se Morre de Amor!

Se se morre de amor! — Não, não se morre,
Quando é fascinação que nos surpreende
De ruidoso sarau entre os festejos;
Quando luzes, calor, orquestra e flores
Assomos de prazer nos raiam n'alma,
Que embelezada e solta em tal ambiente
No que ouve, e no que vê prazer alcança!
(...) Amor é vida;
é ter constantemente Alma, sentidos, coração — abertos,
Ao grande, ao belo;
é ser capaz d'extremos,
D'altas virtudes, até capaz de crimes!
Compr'ender o infinito, a imensidade,
E a natureza e Deus;
gostar dos campos, D'aves, flores, murmúrios solitários;
Buscar tristeza, a soledade, o ermo,
E ter o coração em riso e festa;
E à branda festa, ao riso da nossa alma
Fontes de pranto intercalar sem custo
Conhecer o prazer e a desventura
No mesmo tempo, e ser no mesmo ponto O ditoso,
o misérrimo dos entes:
Isso é amor, e desse amor se morre!
Amar, e não saber,
não ter coragem Para dizer que amor que em nós sentimos;
Temer qu'olhos profanos nos devassem O templo,
onde a melhor porção da vida Se concentra;
onde avaros recatamos Essa fonte de amor,
esses tesouros Inesgotáveis, d'ilusões floridas;
Sentir, sem que se veja, a quem se adora,
Compr'ender, sem ouvir, seus pensamentos,
Segui-la, sem poder fitar seus olhos,
Amá-la, sem ousar dizer que amamos,
E, temendo roçar os seus vestidos,
Arder por afogá-la em mil abraços:
Isso é amor, e desse amor se morre! (...)

goncalves dias

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